A importância da preservação da linguagem para a vida humana é semelhante à importância da água para os peixes. Estamos imersos em uma linguagem, pensamos em uma linguagem e vivemos em uma linguagem. A corrupção das palavras ameaça nossa convivência social e o progresso humano.
No momento em que há uma mobilização global para proteger o meio ambiente, é igualmente importante direcionar uma mobilização semelhante para preservar a integridade das palavras, pois sua deterioração coloca em risco nossa vida moral. Enquanto os transtornos climáticos despertam a percepção de um problema sério no planeta, a corrupção da linguagem não é tão visível, mas tem impactos igualmente prejudiciais para a democracia e a convivência humana.
A manipulação da linguagem sempre existiu, mas seu alcance atual é amplificado pelos meios de comunicação modernos e pelas redes sociais, gerando caos informacional. As palavras perderam sua sacralidade original e podem ser distorcidas de acordo com o poder de quem as utiliza. Surgiram até mesmo os chamados “fatos alternativos”, que tentam impor uma realidade manipulada.
A política é especialmente propensa à manipulação da linguagem, pois as palavras são as principais armas dos políticos. No entanto, hoje em dia, as palavras têm um alcance ilimitado graças à tecnologia eletrônica e podem ser registradas para sempre. Isso faz com que a disseminação de falsidades e mentiras tenha um impacto duradouro nas relações interpessoais e no funcionamento dos governos democráticos, onde a comunicação é essencial.
As democracias são particularmente vulneráveis a esse problema, pois permitem um multiverso informacional onde há livre circulação de ideias e informações. Diferentemente dos sistemas autoritários, onde o Estado controla as fontes e o fluxo de informações, além de deter o monopólio da manipulação da linguagem. Essa realidade contribui para a instabilidade e polarização das democracias, enquanto os regimes totalitários aparentam ser mais tranquilos, pelo menos à primeira vista.
No entanto, não devemos atribuir exclusivamente à internet o controle e o uso político da linguagem. A grande mídia também se rendeu ao uso de dialetos políticos em vez de uma linguagem com sentido universal. James Bennet, um experiente jornalista americano, apontou que a imprensa atualmente prefere atender às preferências de suas audiências partidárias, renunciando assim ao papel de ajudar as pessoas a compreender o mundo e contribuir para sua melhoria.
Guerras culturais e polarização política estão dividindo nosso país ao meio. Em uma nação como a nossa, o verdadeiro problema reside no crescimento econômico e na erradicação da pobreza. Infelizmente, é difícil encontrar essa agenda nos debates políticos e nos meios de comunicação. Conflitos e divisões se multiplicam enquanto essa verdadeira questão é negligenciada.
Vivemos em tempos em que não conseguimos mais concordar sobre os fatos e nem mesmo falar a mesma língua. Isso representa um grande desafio para a nossa democracia, pois ela só estará verdadeiramente protegida quando todos os lados puderem compartilhar os mesmos fatos e chamá-los pelo mesmo nome.
É fundamental que tenhamos um terreno comum, uma base sólida de informações que sejam reconhecidas e aceitas por todos. Infelizmente, a polarização e o crescimento das chamadas “bolhas de informação” têm contribuído para a fragmentação do debate público.
A diversidade de opiniões é essencial em uma democracia saudável, mas quando não conseguimos nem mesmo concordar sobre os fatos mais básicos, fica difícil construir um diálogo construtivo. O cenário atual é marcado pelo surgimento de “notícias falsas” e pela manipulação da informação, o que amplia ainda mais as divisões entre os diferentes grupos.
Para reverter esse quadro, é necessário investir em educação e em uma cultura de pensamento crítico. Devemos ensinar as pessoas a verificar a veracidade das informações antes de compartilhá-las e a considerar diferentes fontes, a fim de obter uma visão mais abrangente dos acontecimentos.
Além disso, é importante também promover o acesso à informação de qualidade e apoiar veículos de imprensa que seguem princípios éticos e jornalísticos sólidos. Os cidadãos precisam ser encorajados a buscar informações de fontes confiáveis e a questionar aquilo que lhes é apresentado.
O diálogo é essencial para a construção de consensos e soluções coletivas, mas para que isso aconteça, precisamos estar em um patamar em que todos possam concordar sobre os fatos básicos. Só assim poderemos avançar rumo a uma sociedade mais justa e harmoniosa.
Portanto, é responsabilidade de todos nós fazer nossa parte para defender a democracia e combater a desinformação. Devemos buscar conhecer diferentes pontos de vista, checar a veracidade das informações e contribuir para a construção de um ambiente em que todos possam compartilhar os mesmos fatos e chamá-los pelo mesmo nome.