O desempenho da economia brasileira no último ano foi surpreendente, com um crescimento do PIB estimado em 3%. No entanto, as projeções indicam uma desaceleração em 2024, com alta de cerca de 1,5%. Apesar disso, a economista Zeina Latif acredita que ainda há espaço para surpresas positivas.
Zeina destaca que os efeitos das políticas monetárias ainda estão se materializando e que o alívio causado pelos cortes de juros levará algum tempo para se refletir na economia. Além disso, ela ressalta que o endividamento das famílias nos últimos anos, aliado ao aumento dos juros, tem impactado o mercado de crédito, mas acredita que essa situação está entrando em um ciclo de melhora gradual.
No que diz respeito às empresas, Zeina menciona que houve momentos difíceis no último ano, como o problema enfrentado pela Americanas, mas parece haver sinais de recuperação. Ela também aponta que a queda nos investimentos em 2023 foi influenciada por fatores transitórios, como a diminuição da demanda e rentabilidade do setor agropecuário e as incertezas relacionadas à reforma tributária.
Para Zeina, a aprovação recente da reforma tributária é positiva e pode impulsionar a retomada dos investimentos. Ela acredita que a economia brasileira pode surpreender positivamente se esses obstáculos forem superados.
Em relação aos investimentos no ano passado, é importante reconhecer os fatores de curto prazo que podem ter afetado seu desempenho. Um dos principais desafios é a necessidade de impulsionar o crescimento com mais vigor. O Brasil está atrasado nesse cenário e precisa de uma agenda mais ambiciosa para acelerar seu desenvolvimento.
A reforma tributária, por sua vez, deixou a desejar e poderia ter sido melhor. Perder o timing em seu planejamento cobrou um preço alto em 2019. O assunto ficou “cozinhando” por muito tempo, o que levou a movimentações de grupos organizados em busca de benefícios. No entanto, é positivo observar que, apesar dos obstáculos políticos, o país tem mantido uma agenda de reformas. Desde o governo Temer, houve mudanças como a reforma trabalhista e a reforma da Previdência, e agora a reforma tributária. O atual governo, ao criar uma secretaria especial para tratar do assunto e aproveitar discussões de governos anteriores, demonstra mérito nesse processo.
No entanto, há dificuldades políticas enfrentadas pelo governo na implementação da reforma tributária. A pressão dos lobbies no Congresso Nacional resultou em concessões excessivas e questionáveis. Não se pode negar que esta reforma ficou abaixo das expectativas, mas ainda assim é importante aprová-la, pois representa um passo significativo para melhorar o ambiente de negócios do país.
Quanto ao cumprimento da meta de zerar o déficit primário em 2024, o mercado nunca acreditou totalmente nessa possibilidade. Desde o anúncio do Marco Fiscal e das metas, já havia projeções de déficit. Além disso, o aumento da carga tributária é inviável, pois há a necessidade de aumentar gastos com saúde e educação. O arcabouço fiscal atual apresenta inconsistências internas e falta de credibilidade. Um orçamento no qual as despesas crescem 50% em relação às receitas simplesmente não é viável. O mercado financeiro se tranquilizou em relação ao fiscal, pois havia preocupação com uma situação completamente descontrolada, como ocorreu no governo Dilma, mas a expectativa era de um cenário muito desfavorável.
O arcabouço fiscal precisa ser revisto, pois não é sustentável. A meta terá que ser modificada. A tendência do governo é fazer essas mudanças gradualmente, sem impactar muito as expectativas do mercado. Portanto, é provável que ocorram alterações ao longo do tempo.
A discussão sobre a meta fiscal tem sido um tema relevante ao longo deste ano. A Fazenda tem se mostrado cautelosa em relação a possíveis mudanças, que podem ocorrer aos poucos.
No ano passado, o presidente revogou a decisão do Congresso de prorrogar a desoneração de setores da economia. Agora, surge a dúvida sobre qual poderá ser o desfecho dessa disputa entre Executivo e Legislativo.
Um fato concreto é que essa despesa não estava prevista no Orçamento. Portanto, quando for necessário incluí-la, será mais um motivo para repensar a meta. Além da questão fiscal, é importante considerar que a desoneração não foi uma boa política pública. O Congresso já dava sinais de que avançaria nesse tema, então não foi surpreendente. Porém, se o governo realmente quisesse enfrentar essa batalha, teria proposto a medida anteriormente.
Embora concorde com o teor da MP que propõe uma solução intermediária, tenho a sensação de que o governo não está empenhado em vencer essa briga. Parece haver um jogo de cena, pois se fosse uma prioridade real, a discussão teria acontecido antes. Talvez haja uma lógica política que me escapa, mas acredito que nunca foi uma preocupação central do governo.
Em entrevista recente, foi questionado se a equipe econômica tem autonomia em relação ao presidente. A resposta é clara: nenhuma equipe econômica tem total autonomia. O máximo que o ministro pode fazer é apresentar ao presidente a melhor solução técnica e participar das negociações. No entanto, é o presidente quem decide entrar na briga e mobilizar sua equipe política. Não se trata de falta de poder do ministério, mas sim da influência relativa em diferentes momentos e temas.
O ministro Haddad, antes de assumir a Fazenda, era visto com desconfiança pelo mercado. No entanto, ao longo do primeiro ano de governo, ele teve acertos importantes. Sua atuação foi surpreendentemente positiva, demonstrando habilidade em lidar com os desafios econômicos.
Em resumo, a discussão sobre a meta fiscal continua ao longo do ano, com cautela por parte da Fazenda. A disputa entre Executivo e Legislativo em relação à reoneração está em curso, mas falta um engajamento total por parte do governo. A equipe econômica não tem total autonomia, mas pode influenciar nas discussões. O ministro Haddad surpreendeu positivamente em seu primeiro ano no cargo.
A reforma tributária foi considerada um grande acerto, tendo inclusive a criação de uma secretaria específica para isso. O responsável pela pasta mostrou habilidade política em alguns momentos, ao transmitir a importância dessa agenda para o presidente. No entanto, é preocupante que a agenda esteja muito focada no aumento da arrecadação, deixando em segundo plano a contenção de gastos. O desafio para o ministro é encontrar o equilíbrio entre ambos. A inclusão do ex-presidente Lula nessa agenda é uma questão crucial que afeta a percepção dos agentes econômicos e determinará o sucesso da estrutura fiscal. Mais cedo ou mais tarde, a contenção de despesas terá que ser discutida, exigindo sorte para ser implementada. Embora eu não veja o ministro como um desastre, acredito que ele ainda não passou por seu grande teste.